Brasil-Europa: Notícias atuais da organização de estudos de processos culturais em relações internacionais - A.B.E.

Brasil-Europa
Notícias atuais
Organização de estudos de processos culturais em relações internacionais
Academia Brasil-Europa (A.B.E.)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (I.S.M.P.S.e.V.)
 
 

Portal Brasil-Europa      Academia      I.S.M.P.S.      Revista     Contato     Impressum     Estatística

30.12.2014

Principais momentos dos trabalhos euro-brasileiros em 2014. O ano que chega ao fim, tendo iniciado em retiro e trabalhos de arquivo, foi marcado a partir de abril por intensas atividades externas, por ciclos de estudos e visita a instituições em muitos países europeus.


O levantamento e estudo de documentos de 40 anos de atividades do programa de interações euro-brasileiras iniciado em 1974 em trabalho abnegado de membros da A.B.E..forneceram as bases para o intento de realização de „balanços e reajustes“ que determinou as seis edições da Revista Brasil-Europa do corrente ano. Longe de terem esgotado o material, foi este tratado em alguns de seus aspectos até 1981. Os resultados ainda não considerados desse trabalho de arquivo, embora já não constituindo os temas principais, serão divulgados em tópicos dedicados a documentos em próximas edições.


Os retiros para a análise desse material tiveram lugar no país de Wittgestein, em Bad Laasphe, Bad Berleburg, Schwarzenau,  sobretudo em repetidas estadias em Bad Driburg. Os trabalhos de arquivo foram completados com visitas atualizadoras a algumas das cidades e suas instituições que marcaram desenvolvimentos do passado, entre elas Lüneburg na Baixa Saxônia e Leichlingen, na Renânia do Norte. Sobretudo foi porém uma nova visita ao Vaticano que possibilitou a ponte entre as tendências atuais eclesiásticas sob o Papa Francisco e empreendimentos de décadas passadas.


A fundação Brasil-Europa esteve em condições de possibilitar a realização de numerosas viagens e estadias de observações, contatos, estudos e encontros desenvolvidos em muitos países europeus - Inglaterra, Alemanha, Bélgica, Áustria, Eslovênia, Bulgária, Itália, Espanha, Malta, França, Monaco - assim como na Rússia e na Turquia.


O estado de conhecimentos relativos a esses países puderam ser atualizados, novos desenvolvimentos observados, realizando-se contatos e diálogos com pesquisadores e instituições locais.


Em ano marcado por uma verdadeira febre de Brasil na Europa devido aos jogos da Copa do Mundo, com resultados não apenas positivos para a imagem do país e para os estudos mais diferenciados de processos culturais devido ao sensacionalismo de muitas iniciativas, procurou-se, para além da observação das manifestações dessa euforia, dirigir a atenção a complexos temáticos considerados como mais prementes, fundamentais e produtivos para o desenvolvimento dos conhecimentos e das reflexões.


Muitos dos trabalhos inscreveram-se assim no programa de estudos Cultura/Natureza da A.B.E., procurando-se, em determinados contextos e centros de estudos, perspectivas para o tratamento de problemas graves do presente, relacionados com a destruição do patrimônio natural e suas consequências para a qualidade de vida e de valores humanos, mas também positivamente para a consideração de caminhos promissores do passado e do presente quanto à conservação e o cultivo de espécies, a reflorestamentos e à construção responsável de paisagens.


Um peso considerável dos trabalhos do corrente ano foi assim dado a questões de botânica nas suas relações com processos culturais, de paisagismo e configuração consciente de regiões, de análise urbanológica e comparativa de cidades, o que vem de encontro a tendências em alguns centros de estudo da arquitetura e planejamento europeus.


Esses trabalhos iniciaram-se no corrente ano na Pomerânea, em particular na ilha de Rügen, visitando-se vários centros e considerando-se desenvolvimentos na região de Mecklenburg-Vorpommern, salientando-se aqui Rügen e as reflexões no palácio de Grossschwaan. Tiveram a sua continuidade em diferentes cidades da Vestfália e Hessen, entre elas Bad Salzuflen e Bad Wildungen.


A atenção a questões de construção de paisagens e da pesquisa botânico-cultural não podia deixar de levar a uma consideração especial da Inglaterra nos trabalhos de 2014, país que conta com considerável presença brasileira. A partir de um dos maiores centros de estudos e irradiador de tendências avançadas do pensamento e de iniciativas marcadas pela responsabilidade ambiental - o Kew Gardens de Londres - foram visitadas monumentos paisagístico-culturais nas regiões de Kent e Sussex. Relativamente a questões litorâneas, os estudos se ancoraram nas cidades de Eastbourne e Brighton.


Na região do Mediterrâneo, um dos principais centros marcados por preocupações ecológicas nas suas relações com o uso e a configuração responsável dos recursos naturais na expansão urbana é o Principado de Monaco, possuidor de um dos maiores jardins de plantas tropicais da Europa. Os trabalhos ali realizados puderam ser comparados com aqueles de outro centro que possui considerável patrimônio vegetal proveniente do Brasil - o de Balchik, na Bulgária. Do ponto de vista histórico-cultural, deu-se particular atenção a parques e centros de cultivo que constituem hoje monumentos de países e cidades, entre êles o do palácio do presidente de Malta, o do histórico jardim botânico de Pisa,  o Bellini de Catanea e aqueles de Barcelona, cidade que se salienta pelas suas áreas verdes como de importância para o estudo de processos culturais de orientação ambiental.


Dos desenvolvimentos atuais que relacionam construção de cidades e configuração de paisagens no contexto de interesses econômicos e de representação nacional visitou-se as construções olímpicas de Sotschi na Rússia, motivo de reflexões não somente positivas de resultados do pós-moderno nas suas relações com questionáveis consequências de exageros e desperdícios construtivos causados pelos esportes no presente.


Dos contextos regionais, a fundação esteve em condições de promover a continuidade de estudos que vêm sendo realizados no contexto do Mar Negro através da visita de centros arqueológicos e culturais de cidades do norte da Turquia e de Istambul. Deram-se aqui continuidade às reflexões encetadas em 2013 em outras regiões desse país, concentrando-se também agora as atenções em dois complexos temáticos: o dos fundamentos do edifício cultural na Antiguidade - que permanecem vigentes sob muitos aspectos no presente - e o dos desenvolvimentos atuais nas relações entre o Islão e o Cristianismo, hoje marcadas por conflitos e tensões. Essas visitas, precedendo a visita do Papa à Turquia, retomaram em outro contexto reflexões que marcaram visitas a Roma e, entre outros centros relacionados com o Brasil, ao Forum dos Povos dos Franciscanos de Werl na Vestfália.


Essas múltiplas atividades euro-brasileiras do corrente ano, mencionadas brevemente em noticiário, fornecerão bases de relatos em edições da Revista Brasil-Europa de 2015. Elas não poderiam ter sido realizadas sem o empenho idealista de muitos membros da A.B.E., que despenderam tempo, esforços e consideráveis meios para a participação em inúmeros encontros e a consecução de viagens.


Esses trabalhos foram efetivados altruisticamente sem pedidos de apoios a órgãos públicos e instâncias governamentais do Brasil e cujos resultados são colocados à disposição gratuitamente pela internet. Não podem ser esquecidos também todos aqueles correspondentes do Brasil que tomaram parte virtualmente nesse intercâmbio supra-nacional de conhecimentos e experiências e que servem de forma desinteressada unicamente ao alcance de saber e de esclarecimento. Nesse sentido, apesar de muitas nuvens, o ano de 2014 faz surgir um multicolor arco-íris que promete, na sua diversidade, um período promissor de luzes para 2015.



17.12.2014

Zons. Ciclo do Advento e Natal e mercado  - comercialização ou característica do edifício de imagens? Na sessão de Advento realizada no centro de estudos da A.B.E. no dia 13. de dezembro (Veja notícia), consideraram-se tradições de Natal do Brasil e de regiões da Europa - em particular alpinas - que surgem como inigmáticas na sua linguagem visual e no seu sentido.


Refletiu-se, entre outros pontos, sobre a crítica que constantemente se faz relativamente à excessiva comercialização dessas datas festivas e de suas expressões. Lembrou-se, neste contexto, de publicações que em países latino-americanos tratam de excessos de consumo, de procura de lucro e de publicidade comercial em agitação de compras e vendas que dificilmente parecem se coadunar com o espírito da festa e que sugerem uma secularização ou mesmo decadência.


Para além da intensificação das atividades de casas comerciai, de anúncios publicitários e incentivos de consumo, lembrou-se de que mercados de Natal, com ofertas de artesanato, doces, bebidas e produtos caseiros e da terra, com construções típicas ou que sugerem aldeias, burgos ou presépios, fazem parte das tradições de Advento, sendo até mesmo um de seus principais elementos.


Esse fato pode ser observado de forma particularmente intensa na Alemanha, onde há uma grande quantidade de mercados natalinos de „encanto“, de „sonho“ ou „românticos“ sobretudo em cidades ou ambiente históricos, havendo até mesmo competições entre os mercados segundo diferentes critérios.  Essa prática também pode ser observada no Brasil, particularmente em regiões de colonização alemã.


Discutiu-se, assim se não haveria a necessidade de maiores diferenciações na crítica à comercialização. Se de fato, esses mercados de Advento representam importante fator comercial para numerosas cidades, êles próprios, porém, parecem indicar relações mais profundas da idéia e da imagem do mercado com essa época do ano.


Entre os muitos exemplos citados, lembrou-se do „mercado de Natal de lenda“ da cidade fortificada de Zons, uma das mais pitorescas da Renânia do Norte/Vestfália, até mesmo cognominada de Rothenburg o. d. Taube do Baixo Reno.


Um de seus mais destacados monumentos é o antigo burgo. No museu instalado em edifícios que remontam em parte ao século XVII, procura-se relacionar a tradição com a atualidade, oo passado e o futuro. Esse intento de relacionar o velho com o novo abre perspectivas para a consideração do famoso mercado de Advento que ali se realiza. 


A procura das razões mais profundas de relações do mercado ou do comerciar com essa parte do ano - a mais tenebrosa do mundo natural do hemisfério norte - não pode apenas limitar-se à consideração da história de mercados populares, mas exigem antes a análise de edifícios culturais nas suas relações com o mundo natural.


Tudo indica tratar-se aqui da permanência de antigas e complexas relações entre a terra e o homem da terra em correspondência a esse período negro da natureza do hemisfério norte e a fundamental transformação que se opera imaterialmente e que culmina no mistério natalino. Tratar-se-ia, assim, de uma manifestação festiva do conceito de „sacro comércio“?



16.12.2014

Gummersbach. Tradições natalinas na Áustria, na Alemanha e no Brasil. Por ocasião da Assembléia Geral do I.S.M.P.S. do corrente ano, realizou-se no centro de estudos da A.B.E. na Renânia do Norte/Vestfália, no dia 14, encontro festivo de Advento.


Além da consideração dos trabalhos desenvolvidos em 2014 e os projetos para 2015, a reunião incluiu conferência e troca-de-idéias a respeito de paralelos entre tradições do ciclo de Natal da Europa de língua alemã e do Brasil, da análise de suas linguagens visuais, estruturas e mecanismos, assim como da atualidade desses estudos perante os problemas atuais relativos à religião e que se manifestam, na Alemanha, em grandes demonstrações que traduzem receios de uma islamização do Ocidente.


A sessão partiu do número atual da Revista Brasil-Europa, no qual se considera o papel das tradições natalinas nas reflexões e nas iniciativas nos Estudos Culturais e na Educação Musical e Artística nas últimas décadas de iniciativas eurobrasileiras. (Veja) Essa edição foi precedida por visitas de estudos a dois centros de importância para o cultivo e o estudo de expressões tradicionais do ciclo do Advento, Natal e Reis da região de Salzburg: St. Johann im Pongau (Veja) e Hallein. (Veja)


As tradições e a situação do seu estudo e cultivo nessas duas cidades foram consequentemente objeto de reflexões na reunião. Nesse contexto, lembrou-se da presença de várias dessas expressões em outras regiões européias, entre elas na Suiça, onde também ali se constata linguagem visual de costumes que surgem como inigmáticos e demonstram a insuficiência de hipóteses explicativas por parte de pesquisadores de folclore.


Lembrou-se também da visita realizada no corrente ano a museus de etnografia da Bulgária, onde também se constata a presença de similares tradições. S. Hahne, de origem eslovena, confirmou com base em fotos a existência de similares expressões no seu país, estudadas ali também em museus etnográficos. Participantes provenientes da Romênia também o fizeram relativamente a regiões de antiga população alemã, em particular da Transilvânia.


Na conferência, foram considerados sobretudo pastoris da Bahia e do Nordeste do Brasil com base em gravações e fotografias, oferecendo-se um panorama do desenvolvimento dos estudos em contexto internacional e da sua situação atual. Na troca de experiências, puderam ser comparadas constatações do estado do cultivo de tradições no litoral da Bahia e do Nordeste realizadas por diferentes pesquisadores nas décadas de 70 e 80. A. Schumann, que viveu no Brasil durante muitos anos, mencionou observações que fêz de expressões da religiosidade no Brasil.


Na conferência, salientou-se a necessidade de estudos do sistema de visão do mundo e do homem e da antiga hermenêutica para a compreensão da linguagem visual de muitas expressões tradicionais hoje não compreendidas no seu sentido, mas nas quais o homem se integra. Essas análises abrem perspectivas para a compreensão de edifício cultural que condiciona o homem ainda no presente, assim como para um redirecionamento da atenção do histórico ao sistemático.


Nessa superação de referenciações históricas de construtos culturais de antiga proveniência poder-se-ia encontrar um caminho para a superação de fundamentalismos religiosos no presente e uma base comum para o debate interreligioso, não apenas o ecumênico entre o Catolicismo, a Ortodoxia e o Protestantismo, como também no difícil encontro com o Islão, uma vez que se baseiam na história registrada na Escritura e em outros textos.



15.12.2014

Paris. Obras de Leopoldo Miguéz (1850-1902) interpretadas por Braz Velloso. Uma das duas gravações recentemente lançadas do pianista brasileiro Braz Velloso (Veja notícia anterior) adquire particular significado não apenas pela qualidade de suas interpretações, como também pela contribuição ainda maior que presta aos estudos musicológicos de orientação cultural: aquela dedicada a obras para piano de Leopoldo Miguéz. (Naxos 9.70199)


Nesse CD, gravado na Igrreja Evangélica de Saint Marcel de Paris em novembro de 2011, produzido por Nikolaos Samaltanos e editado por Evi Eliades, o pianista inclui várias peças do compositor gravadas pela primeira vez. O CD inclui Souvenirs, op.20 (Nocturne, Mazurka, Scherzetto, Lamento); Scênes intimes, op. 24 (Berceuse, Chanson d‘une jeune fille, Conte Romanesque, Bavardage); Faceira (Valse-Impromptu) op. 28; Morceaux lyriques, op. 34 (L‘Improvisateur, Saudade, Pologne, La Mendiante, Plaisanterie); Nocturne, op. 10 e Allegro appassionato, op. 11


O significado dessa realização de Braz Velloso e das obras gravadas apenas pode ser avaliado adequadamente considerando-se o debate de décadas que vem sendo desenvolvido em meios especializados no âmbito das instituições, eventos e cursos universitários voltados às relações entre o Brasil e a Europa.


Se Henrique Oswald foi considerado em conferências/concertos e simpósios - entre outros na Semana França/Alemanha/Brasil do Forum de 1982 - Leopoldo Miguéz tem recebido ainda maior atenção devido a seus estreitos elos com desenvolvimentos alemães. Estes, porém, inserem-se em contextos internacionais da época, devendo ser considerados na complexidade de suas interações e múltiplas dimensões, em particular também político-culturais.


A consideração de sua obra não é apenas de significado para o Brasil ou para a difusão da música de compositores brasileiros na Europa, como também para a própria pesquisa músico-cultural na Europa no âmbito dos esforços de desenvolvimento de uma musicologia histórica que procura superar posições convencionais delimitadas geograficamente e ampliar-se através de perspectivas teórico-culturais.


Essas amplas dimensões de significados recíprocos foi considerada entre outras ocasiões quanto à problemática wagneriana nas suas relações com o Brasil e na sua recepção francesa por ocasião dos 100 anos da Casa de Festivais de Bayreuth em 1976, no contexto do projeto de recepção musical no Brasil em 1979/80 e em simpósio das Comunidades Européias de 1982 a 1984. Essa consideração da reciprocidade em processos receptivos teve repercussões em trabalhos universitários voltados à Escola Nova Alemã nas suas dimensões internacionais, em particular no concernente ao Poema Sinfônico e suas expressões no continente americano.


O significado - e a problemática político-cultural - da obra de L. Miguéz esteve sobretudo no centro das atenções em concerto camerístico e sessão acadêmica solene realizada em Maria Laach sob o patrocínio da Embaixada do Brasil na Alemanha à época do Congresso „Música e Visões“ (1999) do triênio pelos 500 anos do Brasil.


A realização sonora das obras para piano de L. Miguéz nesse CD de Braz Velloso representa assim, não só pela sua excelência interpretativa, uma contribuição de extraordinário significado para o desenvolvimento dos estudos especializados, tornando-se desde já material indispensável para apreciações e análises em aulas, seminários e colóquios.



14.12.2014

Paris. Obras de Henrique Oswald (1852-1931)  interpretadas por Braz Velloso. O pianista brasileiro Braz Velloso, radicado em Paris, lançou duas gravações pela Naxos, respectivamente com obras de Henrique Oswald e Leopoldo Miguéz (1850-1902), que podem ser consideradas entre as mais significativas produções artísticas e de pesquisa musical aplicada do presente. Ambos os CDs incluem pormenorizados textos de Sérgio Bittencourt Sampaio. Atenção merecem as imagens do Rio de Janeiro  de pinturas de Rosalbino Santoro (1884) e de Arthur Thimóteo da Costa (1918) na página-face das gravações, obras da coleção Fundação Sergio Fadel.


Braz Velloso iniciou os seus estudos no Conservatório Brasileiro de Música, tendo tido como professores Homero Magalhães, Lucia Branco e Estela Caldi. Entre 1972 e 1974 tomou parte nos cursos internacionais da Pró Arte em Teresópolis. Transferiu-se para Paris
em 1975, passando a ter aulas com Monique Deschaussées e posteriormente com Marian Rybicki na Ecole Normale de Musique. De 1980 a 1985 participou de master-classes de Monique Déchaussées em Barcelona e de Leon Fleisher e Magdalena Tagliaferro em Paris. As suas atividades de solista e em conjuntos de câmara são intensas, tendo-se apresentado no Brasil e em diversos paises europeus. Concebeu eventos que incluem piano, texto e dança, apresentados em várias cidades do Brasil e em Paris.


O CD Henrique Oswald Piano Music (Naxos 9.70200), produzido na Alemanha, foi gravado Igreja Evangélica Saint Marcel de Paris, em junho de 2012. Êle inclui as obras Six Morceaux op. 4 (ca. 1867), com Waltz, Réverie, Menuet, Berceuse, Barcarolle e Impromptu; Trois Romances op. 7; Il Neige; Six Pièces op. 14, com Berceuse, Mazurka, Tarantelle, Barcarolle, Nocturne e Scherzo, e Feuilles d‘Album, op. 20, com Inquiétude, Chansonette, Feux follets e Désir ardent.


Não só as qualidades da sua realização das obras, como também a própria produção visual e de conteúdo dos CD's testemunham não apenas excelência técnica, como grande sensibilidade e atenção  à captação do espírito da época.



11.12.2014

Eichstätt. O Ano Barroco 2014 e a solidariedade com cidades do interior da Bahia. A cidade bávara de Eichstätt, sede da Diocese de Eichstätt-Ingolstadt, é um dos mais importantes centros do Catolicismo na Alemanha. Possui uma renomada universidade católica, várias instituições acadêmicas e vital e diversificada vida cultural e artística.


Eichstätt desperta no corrente ano particular atenção devido à programação do Ano Barroco pela passagem dos 300 anos da morte do arquiteto Jakob Engel (Jacomo Angelini, 1632-1714) um dos principais criadores da fisionomia urbana que até hoje marca Eichstätt.


Pelo seu bem conservado conjunto arquitetônico, Eichstättt é um dos maiores monumentos do Barroco europeu. O fato da cidade representar em si uma obra de arte barroca foi resultado da transformação por que passou após a Guerra dos 30 anos.


Eichstätt, que possuia uma história cristã secular - sendo um dos seus maiores vultos S. Willibald - experimentou nessa época, sob a égide de Príncipes-Arcebispos, uma metamorfose que lhe conferiu uma feição quase que sul-européia. A isso contribuiu a linguagem visual de arquitetos de Graubünden, entre êles Jakob Engel.


Por motivo do Ano Barroco, a A.B.E. promoveu uma nova visita a Eichstätt. A atenção não foi porém dedicada a paralelos entre a arquitetura dessa cidade e aquela das cidades históricas brasileiras, apesar das grandes perspectivas que aqui se abrem para o estudo de processos culturais transcontinentais do Catolicismo e da recatolização.


A intensa presença do Brasil em Eichstätt é devida sobretudo à existência de uma associação beneficiente missionária que possui contatos com duas cidades do sertão da Bahia: Campo Alegre de Lourdes e Pilão Arcado. Essa sociedade é presidida nada menos do que pelo bispo de Eichstätt, D. Gregor Maria Hanke OSB, que também é membro de Congregações e outras instituições romanas.


A razão desse empenho pelo Brasil é decorrente do fato de seu irmão, o Redentorista Pe. Bernhard Hanke, atuar no interior da Bahia. A sociedade é também apoiada administrativamente pela irmã desse sacerdote, Dorothea Schmid. A Vice-Presidência da entidade encontra-se a cargo do P. Gerald Hanke CSsR que já esteve várias vezes na região baiana e que domina o português, sendo assim importante mediador nas relações entre Eichstätt e o Brasil.


A família Hanke possui passado migratório, uma vez que foram exilados da sua região natal, que no passado era a da Silésia austríaca. Talvez explique-se assim o empenho do Pe. Bernhard Hanke e seus irmãos pelos necessitados do sertão baiano. Grande é a disposição dos habitantes de Eichstätt em contribuir com o seu trabalho através de envio de pacotes com mantimentos em época de sêca para o Brasil.


O problema da falta de água nessa região da Caatinga e as dificuldades de vida da população rural são as questões que marcam a imagem do Brasil em Eichstätt e dão ensejo a iniciativas altruisticas de auxílio às paróquias de Nossa Senhora de Lourdes de Campo Alegre de Lourdes e de Santo Antonio de Pilão Arcado que merecem toda a admiração, respeito e gratidão.



08.12.2014

Erkeling/Altmühltal. O barril que nunca se esvazia. A cerveja nas relações entre o Brasil e o mundo de cultura alemã - o culto a S. Othmar (Audemar, Odemar) na Baviera, Áustria, Suiça e Alsácia. A imagem da Alemanha, em particular da Baviera no Brasil é popularmente marcada pelo consumo da cerveja. Mesmo na música revela-se essa imagem através de tradicionais e populares canções. Uma de suas maiores manifestações é a festa de outubro de Munique, hoje festejada no Brasil, em particular em regiões de passado colonial alemão, acompanhada por atributos culturais tradicionais e com o uso trajes típicos. Muitos brasileiros não medem esforços para participar desse evento na própria Baviera.


Esse fenômeno social e cultural e o próprio consumo da cerveja no Brasil merecem ser analisados sob a perspectiva dos Estudos Culturais sob diferentes aspectos. Do ponto de vista histórico, pode-se considerar a introdução e a popularização da cerveja, das cervejarias tanto do ponto de vista do desenvolvimento do comércio, da indústria e do empresariado, como também no seu significado urbano e arquitetônico manifestado nos pavilhões e cervejarias de parques e jardins, como aquele do Jardim da Luz em São Paulo.


Dimensões mais profundas e abrangentes abrem-se quando se considera a cerveja e o vinho nas suas inserções no edifício cultural e de imagens transmitido através dos séculos.


Uma oportunidade para tais considerações dá-se com a celebração da festa de S. Othmar no dia 16 de novembro, um santo pouco venerado no Brasil. Se no Brasil, seguindo-se sobretudo tradição portuguesa, lembra-se nesse mês sobretudo de S. Martinho como aquele corta os seus próprios trajes para dá-lo aos pobres, S. Othmar é aquele cujo barril nunca se esgota na distribuição do seu conteúdo. O barril surge como um dos principais atributos do santo, representado em imagens e pinturas em diversas igrejas do espaço de língua e cultura alemã marcado pelo cultivo da cerveja e do vinho.


O santo com o barril é particularmente venerado na Suiça e na Alsácia. O dia de sua festa é rememorado sobretudo na diocese suiça de Chur, mas também nas da Basiléia e em Freiburg no Breisgau. A casa onde foi exilado à época de sua perseguição é hoje capela muito visitada em Werd, uma ilha do Reno. Segundo a tradição, o barril remonta ao milagre vivenciado pelos monges de S. Gallus que se dirigiram a esse local para transportar o corpo do santo ao convento e que podiam beber de um barril o tanto que quisessem, pois este nunca se esvaziava.


Igrejas devotadas a S. Othmar incluem-se entre as mais significativas para a história da arquitetura dessa região européia, salientando-se a barroca de Mödling na Áustria, cuja representação do santo surge na bandeira da corporação de produtores de vinho. O principal templo que traz o seu nome é o de S. Othmar dos „curtidores de couro branco“ Weißgerber) de Viena - couro que é utilizado sobretudo na construção de órgãos - e que representa uma das principais construções sacras do Historismo da capital austríaca.


As relações do culto e de expressões festivas com a área de vinhedos e de plantio da cevada de regiões católicas ou de antiga formação católica da Europa Central justificam uma consideração de S. Othmar no âmbito das relações Cultura/Natureza, como estudadas no projeto da A.B.E.. Esse santo dirige a atenção a uma época decisiva no processo de cristianização dessa região européia e à fundação de um de seus principais centros religiosos e culturais do Beneditismo, o mosteiro de S. Gallus (St. Gallen).


Já esse fato desperta o interesse do pesquisador que se ocupa com a história da erudição e dos conhecimentos, da arquitetura, das artes e sobretudo da música, uma vez que esse convento, a sua „escola“ e seus manuscritos são continuamente lembrados nas respectivas áreas disciplinares. Esse mosteiro de S. Gallus foi assim repetidamente alvo de visitas de pesquisadores brasileiros dedicados a questões de Canto Gregoriano e Paleografia nas décadas de 70 e 80, sobretudo em estudos orientados pela Ir. Maria do Redentor (Eleanor Dewey).


S. Othmar (ca. 689-759) surge como representante de uma cultura da alemanidade de contextualização suiça, onde provavelmente nasceu e onde faleceu, assim como dos elos da escola catedralícia de Chur com o desenvolvimento do mosteiro de S. Gallus que, à época de sua vinda, era apenas uma ermida. Foi Othmar que introduziu a Regra de S. Bento e a êle deveu-se seu extraordinário enriquecimento da abadia. Essa sua riqueza foi devida a doações de alemães de posses, entre elas a do suprimento regular com grande quantidade de cerveja por parte de um plantador, sendo esse documento do ano de 753 a mais antiga fonte do termo cerveja na sua forma latina (cerevisia).


Foi essa riqueza, que Othmar compartilhava com os pobres e necessitados, em particular também com aqueles que sofriam de doenças contagiosas de pele ou cegos. Othmar, pelo seu  nome e tipo humano de exemplaridade é ao mesmo tempo rico e „pai dos pobres“. Os estudos tipológicos reconhecem aqui similaridades com aquele de Lázaro e abrem caminhos para o reconhecimento de paralelos com formas de culto transmitidas pela tradição no Brasil e que, devido a falsas aproximações e hipóteses da pesquisa cultural surgem como enigmáticas.



07.12.2014

Altmühltal/Baviera - Ano Eichstätt 2014. Debate sobre deterioração natural e cultural de regiões por rêdes de transmissão energética. Paralelos paleontológicos com o Brasil:Crato, o „Solnhofen do Brasil“.


No âmbito dos trabalhos do programa Cultura/Natureza da A.B.E., revisitou-se no corrente ano o Parque Natural do Vale do Altmühl, na Francônia, Baviera. Essa região adquire particular atualidade no presente devido ao „Ano Barroco de Eichstätt 2014“, celebrado pela passagem dos 300 anos de morte do arquiteto Jakob Engel (1632-1714).


O rio Altmühl corta em lento fluir um vale entre terras altas, dirigindo-se ao Danúbio. Esse vale é uma das mais frequentadas regiões de férias de alemães pela beleza de suas paisagens, marcadas por água, prados e rochas, assim como  por suas cidades históricas, burgos e castelos.O Altmühl passa por cidades como Treuchtlingen, Solnhofen, Dollnsten, cortando sobretudo Eichstätt.


A partir dessa cidade, o rio leva às cidadezinhas de Kipfenberg, Kinding, Beilngries e Dietfurt, atingindo o canal que liga o rio Main ao Danúbio. Esse canal - e em geral o problema de represamentos e canalizações do Danúbio - determina as discussões ecológicas da atualidade.


Estas ganham nova intensidade com projetos de torres para rêdes de fios de transmissão de energia „limpa“ganha em outras regiões da Alemanha mas que prejudicam a paisagem e a vida de suas cidades. Essa região, assim, oferece possibilidades para a observação de dilemas que se colocam também quanto a soluções relativas à energia não-atômica ou fóssil.


É justamente sob o aspecto geográfico-paleontológico que a região do Altmühltal tem sido considerada em paralelos com o Brasil. Esses vínculos evidenciaram-se em passado recente, quando, em 2011 realizou-se, no Museu de Solnhofen, exposição que estabeleceu pontes com o Brasil. Nela foram expostas lâminas calcáreas do Crato, cognominado de „Solnhofen brasileiro“. Essa denominação justifica-se pelo fato de ter-se encontrado também no Brasil fósseis em cortes de pedras de grande valor para a ciência. Um desses fósseis, um sáurio, sugere um parentesco com o Compsognathus constatado na Baviera. Outro fóssil sulamericano apresentado foi um sáurio com asas.



05.12.2014

Istanbul. A linguagem visual dos mosaicos do Boukoleon em leitura brasileira à luz de tradições pastorís do ciclo natalino. A viagem do Papa à Turquia, revelando a intenção de estabelecimento de pontes entre as diferenças religiões, dirige a atenção do pesquisador aos edifícios culturais nos seus remotos fundamentos comuns que poderiam abrir perspectivas para aproximações recíprocas. Sob esse aspecto, considerou-se o simbolismo numerológico da Hagia Sophia, que indica a continuidade através dos séculos de conhecimentos da natureza e do cosmos nas suas múltiplas associações e implicações. (Veja notícia anterior)


Menos abstratas e de particular relevância para estudos culturais do quotidiano do passado e de tradições populares são as cenas do grande mosaico do palácio de Boukoleon, pertencente ao complexo do Museu da Hagia Sophia, um dos palácios bizantinos da antiga Constantinopla. Construído no século V, encontra-se em local elevado às margens do mar de Marmara, ao sul do antigo Hipódromo.


O descobrimento e a investigação da área de grandes dimensões do antigo centro de poder dos imperadores de Bizâncio constituem uma das principais tarefas de trabalhos arqueológicos em Istanbul, levados a efeito em cooperação a Academia Austríaca das Ciências, sendo o mosaico do Boukoleon é a sua mais magnífica revelação.


Os mosaicos encontrados, ainda que muitos em fragmentos, com ca. de 150 figuras humanas, nas quais se reconheceram 90 motivos, oferecem um amplo panorama que exige interpretações de sentidos. Neles surgem figuras de pastores, trabalhadores ee caçadores, cujos trajes, armas e outros objetos e atributos adquirem significado histórico-cultural do dia-a-dia de remotos séculos. Junto a essas imagens, surgem animais selvagens que atacam o homem e são repelidos, e que são representados também como lutando entre si. No conjunto se inserem animais fabulosos alados, destacando-se a figura mítica de Belerofonte e do cavalo Pégaso.


Essas imagens teem sido consideradas isoladamente, sentindo o observador familiarizado com a linguagem visual de expressões tradicionais a falta de visões e de análise de conjunto. Já as referências mitológicas em época cristã exigem a consideração dos sentidos que as justificam; elas não devem ser consideradas como meros relitos do passado „pagão“, mas sim como relevantes documentos de um sistema de concepções e imagens que se manteve, ainda que metamorfoseado nos seus sentidos, no processo de cristianização da Roma do Oriente.


Um ponto de partida para a compreensão desses sentidos é o próprio nome do palácio: Boukoleon. Essa designação foi dada no século VI sob Justiniano I („Casa de Justiniano“) ao local, relativamente afastado, próximo ao mar, região de vida portuária.


Segundo a tradição, esse porto seria marcado por duas estátuas emblemáticas, a de um boi e de um leão.O boi relaciona-se etimologicamente com a designação Boukoleon, e esta com a vida de pastores, aqui compreendidos sobretudo como boiadeiros e vaqueiros. No mosaico, surge além do boi também o cavalo (ou burro), que na antiga simbologia possuía outros sentidos. É assim sob o signo do bucolismo que o edifício e o mosaico devem ser analisados nos seus sentidos.


A imagem do boi e do leão surge também no mosaico, aqui porém em luta. Esse motivo, também conhecido de outros contextos, denota relações com a filosofia da natureza nas suas associações com a linguagem do zodíaco, ou seja, da tensão entre os elementos terra e fogo nos seus sentidos naturais e imateriais.


Relações com os elementos, os meses e os signos manifestam-se também na imagem da águia que vence a serpente. Esse motivo, conhecido do passado helênico e de sepulturas romanas, era de remoto passado, já presente no ato de incineração do amigo divinizado de Alexandre Magno, em 324 A.C.. Sendo a águia imagem anti-tipo do escorpião, constata-se aqui o cunho anti-tipológico de todo o mosaico, compreendendo-se assim a  cristianização do antigo edifício de visão do mundo e suas imagens. A serpente surge também juntamente com o cervo, o animal de Diana, que segundo antigas concepções seria o seu inimigo, imuno contra o veneno.


Também o mito do antigo herói e de Pegasus revela elos cosmológicos com as constelações, substituindo aqui Perseus, na interpretação cristã associado com o apóstolo Paulo. O mesmo pode-se ver na representação de ursas, considerando ainda serem „ursinhas“ as meninas de Diana . A moldura, com motivos vegetais, sobretudo folhas de acanto, frutos e máscaras, tem conotações dionisíacas, sendo Dionysos representado como criança.


Essas relações foram na visita de pesquisadores da A.B.E. pouco antes da viagem do Papa consideradas a partir dos conhecimentos já ganhos da análise da linguagem visual de tradições do ciclo de natal do Brasil. Tratando a atual edição da Revista Brasil-Europa dessas expressões tradicionais, em particular do Pastoril (Veja), a sensibilidade encontrou-se aguçada para atentar sobretudo à simbologia de cores do azul e do encarnado que se constata nas imagens de pescadores e, sobretudo de pastores, estes de ovelhas e cabras.


Toda a representação revela um sentido lúdico, sugerido pela imagem de meninos que brincam com uma roda, aqui reconhecendo os arqueólogos elos com partidos do público que, no Hipódromo, favoreciam diferentes competidores. Ao mesmo tempo, as cores possuiam relações com partidos políticos.


Uma figura de central significado é a de uma mãe que amamenta um filho, tendo ao lado um cão, que já foi reconhecida como similar a representações de Isis. Sabendo-se que Isis no sincretismo foi harmonizada com Demeter ou Da, o pesquisador reconhece os profundos elos tanto com os elementos naturais como com imagens da tradição bíblica comuns em formas de culto ainda praticadas no Brasil.


A representação lúdica sugere uma caminhada, a chegada de regiões longínquas do Oriente, sugerida por meninos que cavalgam um dromedário. Ao lado do Leão também surge o Elefante, seu  inimigo,  no contexto do triunfo na Índia de Dionísio.


O reconhecimento de sentidos na leitura do grande mosaico demonstra que os estudos da Antiguidade não podem ser conduzidos apenas segundo a tradição filológica humanística, exigindo a consideração de resultados de estudos culturais empíricos de tradições vivas em países como o Brasil. A recíproca, porém, também é válida. Somente estudos aprofundados de antigas concepções, imagens e visões do mundo e do homem podem possibilitar compreensões de sentidos de tradições lúdicas que constituem inestimáveis valores do patrimônio cultural do Brasil.




03.12.2014

Istanbul. Pela visita do Papa à „mesquita azul“. A beleza da Criação e a compreensão mútua de religiões - dimensões da Percepção no diálogo cultural. Um dos pontos mais significativos da estadia do Papa Francisco à Turquia sob o ponto de vista do observador de desenvolvimentos culturais no presente foi a sua visita à „mesquita azul“.


Se a Hagia Sophia é hoje um museu e se a sua visita remete a mente ao passado bizantino anterior à conquista de Constantinopla pelos maometanos, não deixando assim de ser acompanhada pela memória de um passado doloroso para o europeu, a mesquita do sultão Ahmed I é uma obra já totalmente representativa da ordem religiosa estabelecida, constituindo exemplo magno da arquitetura muçulmana.


Iniciada em 1609 e terminada em 1616, a sua construção coincide com a época do Barroco no Ocidente, marcado pelo esplendor das igrejas então construídas. Como estas, a „mesquita azul“é admirada pela sua magnificência, pela beleza que extasia os seus visitantes.


Surge assim como sinal de especial significado que o Papa tenha visitado essa mesquita e ali, em atitude meditativa, ter-se voltado a Meca. Esse ato, não podendo ser interpretado como oração, indica porém não só respeito, como também louvor da Criação - que se manifesta na beleza da arquitetura - e as dimensões transreligiosas e transculturais de um direcionamento ao Oriente e, assim, à luz.


Assim como outras mesquitas, o grande modêlo dessa obra grandiosa da arquitetura islâmica é a Hagia Sophia, e esta, na linguagem visual que se expressa em relações numéricas de suas proporções e que possuem múltiplas associações com elementos da natureza e a ordem do universo de remotas origens, revela a permanência, através dos séculos, de um edifício cultural marcado pelo pensamento da Antiguidade, em particular pela Filosofia da Natureza. (Veja notícia anterior)


Em visita de estudos promovida pela A.B.E. pouco antes da viagem do Papa, considerou-se o significado que pode ser reconhecido na fascinação que a mesquita desperta nos observadores de formação cultural cristã que a contemplam.


Decorrendo esta não de convicções religiosas segundo a tradição muçulmana, explica-se essa admiração pelo impacto que o edifício causa pelo esplendor da beleza, não só pela riqueza decorativa, mas sim pela ordenação de seus espaços, reveladores de uma lógica intrínseca.


Trata-se, assim, de uma contemplação de natureza estética, de percepção, da vivência do poder que a leitura da beleza do mundo perceptível pelos sentidos pode ter.


Essa tomada de consciência favorece uma resensibilização à grandiosidade da Criação e ao dever do Homem em não destruí-la. Exige assim a sua modéstia em reconhecer que não é o seu dominador, que dela pode fazer o que bem entender, mas que deve ser o seu protetor.


A contemplação dessa obra traz assim à lembrança que a Estética não é apenas uma questão de cosmética superficial, mas de percepção do Belo nas suas dimensões mais amplas, e que este é relacionado estreitamente com a Ética e com a Lógica.


Coloca-se, aqui, a perspectiva que se impõe por parte dos estudos euro-brasileiros. Devido ao deslocamento do ano natural no Brasil em relação àquele do hemisfério norte, o edifício cultural transplantado através da colonização caracteriza-se por uma defasagem da linguagem visual de suas expressões relativamente à natureza.


Desse fato decorrem grandes riscos, mas também possibilidades. O grande risco reside na perda de significados do mundo envolvente, percebido pelos sentidos, levando a uma desvalorização da Natureza, de graves consequências. As possibilidades, por outro lado, derivam justamente desse mundo virtual deslocado do natural e que pôde ser conservado por essas características de forma mais intensa em países como o Brasil do que no hemisfério norte. Pode-se, assim, através da análise desse edifício, redecosbrir seus originários elos com o mundo natural e, assim, contribuir a visões do complexo cultural perdidas na Europa. Essa leitura pode, também, contribuir ao necessário relativar de sentidos de mundos virtuais nas suas referenciações históricas de tradições religiosas, assim como ao estabelecimento de pontes sobre o abismo entre religiões e expressões culturais tradicionais e as ciências naturais. Pode trazer à consciência o significado da Filosofia e da Percepção, da Estética compreendida nas suas mais profundas dimensões, indissoluvelmente vinculada que deve ser à Ética e à Lógica.



1.12.2014

Istanbul. Pela visita do Papa Francisco à Hagia Sophia - obra magna para estudos arquitetônicos de orientação cultural e de antigas concepções do mundo e do homem. A Hagia Sophia foi a principal igreja da Cristandade do Oriente até a conquista de Constantinopla em 1453. Foi então islamizada, recebendo minaretes e passando por outras modificações. Essa transformação representou simbolicamente o mais crucial golpe para o Cristianismo, poucas décadas antes do Descobrimento do Brasil.


Desde a 1934, sob Kemal Atatürk, é museu (Ayasofya), e vários dos mosaicos bizantinos puderam ser resgatados, ainda que mantidos escritos do Islão no seu interior. Essa igreja, assim, surge como um modêlo de tensões, transformações, substituições e mesmo interações religiosas e de secularização de edifícios religiosos.


A linguagem visual e ordenação de espaços remetem a antigas concepções do mundo, nos seus fundamentos anteriores à sua  própria construção no século VI e, assim, subjacentes a formas que se tornaram exemplos de outras mesquitas e igrejas do Leste e do Ocidente.


A análise de sua arquitetura indica a cristianização de concepções da Antiguidade tardia sobre o universo e o seu conhecimento através das ciências. Considerada como modêlo máximo de beleza, foi local de coroações de imperadores romanos desde Justiniano I, de solenidades imperiais e sede do Patriarcado ortodoxo por séculos.


A igreja foi construída entre 532 e 537 após a destruição da igreja de Constantino, o primeiro imperador cristão, e a de uma segunda igreja edificada sob Constancio e Teodosio, - da qual restaram relitos. Em mosaico, vê-se o imperador Constantino oferecendo a Maria a cidade de Constantinopla, e o imperador Justiniano a Hagia Sophia. Segundo a tradição, Justiniano referenciava-se segundo Salomão quanto à construção do Templo, até mesmo sobrepujando-o.


Assim como o templo bíblico obedecia a princípios numéricos de sentidos simbólicos, também a Hagia Sophia revela critérios aritméticos e geométricos de significados transcendentes, que devem porém ser considerados antes na corrente dos conhecimentos da antiguidade não-bíblica.


Os seus construtores - Anthemis de Tralles e Isidoro de Mileto - eram eruditos arquitetos e matemáticos em Constantinopla. Isidoro coletou e publicou obra de Arquimedes e destacou-se com um comentário de obra de Heron de Alexandria sobre a construção de cúpulas. Esse conhecimento construtivo manifesta-se na Hagia Sophia com a grande cúpula sobre base quadrada que a caracteriza, à qual se juntam dois átrios semicirculares com meias cúpulas.


Em estudos promovidos pela A.B.E. in loco pouco antes da visita do Papa Francisco, considerou-se sobretudo os aspectos numéricos das proporções da arquitetura nas suas múltiplas implicações segundo o antigo sistema de organização de disciplinas do Quadrivium e que se manteve através dos séculos na tradição das artes liberales.


A simbologia numérica pode ser reconhecida, entre muitos outros casos, nas 12 janelas em cada parede a norte e sul, no 7 da parte baixa e no 5 da parte alta. Essa simbologia numérica deve ser compreendida nas suas relações com o mundo natural - 12 meses ou signos ou 7 dias - e, com a cristianização, nas suas referências bíblicas, - 12 tribos de Israel e apóstolos ou  7 anjos e igrejas. Fundamental é o significado do número 4, assim como do 8 e 10, e, consequentemente, do 40. O quatro tem relações com os elementos e, na cristianização, com os quatro Evangelhos. Significativamente, grandes imagens de serafins dominam o interior.


O número 8 estabelece relações com a antiga Ogdoada, conhecida da Gnose antiga na sua localização acima da região dos planetas, a esfera superior do firmamento. Compreende-se assim, que é o grande mosaico de Maria com o Filho - sede da Sabedoria elevada às alturas - que domina o espaço, rodeada pelo mundo angelical representado pelos arcanjos Gabriel e Miguel.


Essas e outras relações numéricas foram consideradas no simpósio internacional dedicado às relações entre música e visões sob a perspectiva da religião na abertura das comemorações dos 500 anos do Brasil em Maria Laach, em 1999, pelo erudito beneditino Pe. Dr. Willibrord Heckenbach. (Veja)


Em Istanbul, porém, salientou-se outros aspectos do sistema de correspondências - o das relações entre os elementos e as disciplinas matemáticas do Quadrivium.


Nesse sentido, a igreja não é apenas uma obra a ser considerada sob a perspectiva da Aritmética e da Geometria - nas suas relações com ar e terra - mas sim e sobretudo com a Música e a Astronomia - nas suas relações com a água e o fogo. É sob esse aspecto que se revela o significado da luz que, no passado, inundava o interior da Hagia Sophia, tanto nos seus significados no mundo visível como na sua interpretação religiosa de referenciação bíblica manifestada no mundo angelical e em Maria. A igreja é, assim, também uma obra de música configurada pelo número e, sobretudo, de luz interna ou espiritual.


Essas análises na Hagia Sophia trazem à consciência que são nesses fundamentos que se poderia procurar possibilidades para a construção de intendidas e tão necessárias pontes entre abismos religiosos criados por referenciações de antigos conhecimentos segundo tradições escritas.






« Notícias anteriores               Notícias mais recentes »


























































































































 


para comunicados: Contato

coordenação e redação: Centro de Estudos Brasil-Europa da A.B.E.
Direção geral: Prof. Dr. Antonio Alexandre Bispo, Universidade de Colonia, Alemanha



« Notícias anteriores               Notícias mais recentes »